«Para que [...] Ele dê a vida eterna a todos os que Lhe confiaste»
«No grande Credo
da Igreja, a parte central – que trata do mistério de Cristo a
partir da sua geração eterna no Pai e do seu nascimento temporal da Virgem Maria, passando pela cruz e pela ressurreição, até ao seu regresso –
conclui com as palavras: «De novo há de vir em sua glória, para julgar os vivos
e os mortos».
Já desde os primeiros
tempos, a perspetiva do Juízo influenciou os cristãos até na sua própria vida
quotidiana, enquanto critério segundo o qual deviam ordenar a vida presente,
enquanto apelo à sua consciência e, ao mesmo tempo, enquanto esperança na justiça
de Deus.
A fé em Cristo nunca se
limitou a olhar para trás e para o alto, mas olhou sempre também para a frente,
para a hora da justiça que o Senhor repetidas vezes preanunciara. [...]
Nele, o Crucificado, a negação das falsas imagens de Deus é levada ao extremo.
Agora, Deus revela a
sua Face precisamente na figura do servo sofredor, que partilha a condição do
homem abandonado por Deus, tomando-a sobre Si.
Este sofredor inocente
tornou-Se esperança-certeza: Deus existe, e Deus sabe criar a justiça de um
modo que nós não somos capazes de conceber mas que, pela fé, podemos intuir.
Sim, existe a ressurreição da carne.
Existe uma justiça. Existe a «revogação» do sofrimento passado, a reparação que
restabelece o direito.
Por isso, a fé no Juízo final é,
primariamente e sobretudo, esperança – aquela esperança cuja necessidade se
tornou evidente justamente nas convulsões dos últimos séculos.
Estou convencido de que a questão da
justiça constitui o argumento essencial – em todo o caso, o argumento mais
forte – a favor da fé na vida eterna.
A necessidade meramente individual de uma
satisfação que nos é negada nesta vida, da imortalidade do amor que anelamos, é
certamente um motivo importante para crer que o homem está feito para a
eternidade; mas só em conexão com a impossibilidade de a injustiça da história
ser a última palavra se torna plenamente convincente a necessidade do retorno
de Cristo e da nova vida.»
Bento XVI, papa de 2005 a 2013 | Encíclica «Spe Salvi» §§ 41, 43 | Comentário a Jo 17, 1-11a