O cumprimento da Lei

O cumprimento da Lei

A graça permaneceu velada no Antigo Testamento, mas foi revelada no Evangelho de Cristo quando chegaram os tempos previstos por Deus para a revelação da sua bondade. […] Comparando estas duas épocas, notamos uma diferença profunda.

No sopé do Sinai, o povo, tomado de pavor, não ousava aproximar-se do local onde Deus dava a sua lei (Ex 19); pelo contrário, no cenáculo, o Espírito Santo desceu sobre aqueles que estavam reunidos aguardando a realização da promessa (At 2).

Ali, o dedo de Deus trabalhou em tábuas de pedra (Ex 31,18); aqui, no coração dos homens (Lc 11,20). […]

«A realização perfeita da lei é o amor» (cf Mt 5,17).

Esse amor de caridade não estava escrito nas tábuas de pedra, mas «derramou-se nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado» (Rom 5,5). Portanto, a lei de Deus é a caridade (Rom 13,10).

O desejo da carne não se submete à lei de Deus; nem sequer é capaz disso (cf Rom 8,17). Foi para reprimir o desejo da carne que as obras de caridade foram escritas nas tábuas de pedra; era a lei das obras, a letra que mata aqueles que praticam o mal.

Mas, quando a caridade se espalhou no coração dos crentes, apareceu a lei da fé e o Espírito que dá a vida aos que amam.

Vede como a diferença entre essas duas leis se conjuga perfeitamente com as palavras do apóstolo Paulo: «É evidente que sois uma carta de Cristo, confiada ao nosso ministério, escrita, não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo; não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, que são os vossos corações» (2Cor 3,6.5).

E tudo isso é admiravelmente confirmado pelo profeta Jeremias: «Dias virão em que firmarei uma nova aliança com a casa de Israel e a casa de Judá – oráculo do Senhor. Não será como a Aliança que estabeleci com seus pais. […] Imprimirei a minha lei no seu íntimo e gravá-la-ei no seu coração» (Jer 31,31s).

Santo Agostinho (354-430), bispo de Hipona (norte de África), doutor da Igreja | «O espírito e a letra», §§27-33 | Imagem de congerdesign