O Livro do profeta Habacuc
Introdução
O profeta e o seu tempo
O texto deste
livro bem como os livros históricos não fornecem quaisquer dados biográficos
sobre o profeta Habacuc.
O nome de
Habacuc parece significar simplesmente o de uma planta, o manjericão, e não é
um nome teofórico.
Na narração de Daniel na cova dos leões (Dn 14,33-39)
é referido um profeta Habacuc que
vivia na Galileia, mas isso não é
suficiente para dizer que se trate do profeta que dá nome a este livro.
Os dados para
determinar a época do profeta e do livro são igualmente poucos.
Para chegar a
uma datação aproximada da atividade profética de Habacuc, há que recorrer às
circunstâncias da respetiva profecia.
O texto de
Habacuc pressupõe uma situação de grande opressão.
Não é plausível
ver no opressor a figura de Joaquim, rei
de Judá (609-597 a.C.), como alguns sugerem. Restariam duas hipóteses.
Ou seriam os assírios como agressores, contra os
quais Deus teria suscitado os babilónios
(Hab 1,5-11); isto faria situar a profecia antes do declínio de Nínive em 612
a.C.
Ou seriam os babilónios (Hab 1,6), que, tendo sido
instrumento do castigo de Deus sobre o seu povo, são agora eles mesmos
castigados.
Neste caso, a
atividade profética de Habacuc situar-se-ia entre 605 e 597 a.C., isto é, entre
a batalha de Carquémis, que colocou Nabucodonosor como soberano do novo império,
e a primeira deportação de habitantes de Jerusalém.
Se aceitarmos
esta última hipótese como a mais provável, Habacuc teria sido contemporâneo dos
profetas Jeremias e Naum.
Conteúdo e estrutura
A estrutura do
livro é clara, derivando do próprio conteúdo, dividido em três partes
sucessivas, que constituem igualmente três géneros literários diferentes, ainda
que bem ligados entre si pela coesão do tema. As três partes são:
1.- Diálogo
entre o profeta e o Senhor (Hab 1,2 – 2,4). Este diálogo está constituído por
duas lamentações do profeta (1,2-4; 1,12-17), seguidas por duas respostas do
Senhor (1,5-11; 2,1-4). Contudo, nem sempre é evidente a correspondência entre
cada uma das lamentações e as respostas recebidas.
2.- Cinco
imprecações contra o opressor (Hab 2,5-20).
As imprecações
são compostas segundo um modelo preciso: começam com uma maldição («Ai de quem...»)
e, com exceção da última, terminam com uma referência ao motivo que provocou
tal maldição.
Nestas imprecações
está espelhada a situação internacional de guerra e de injustiça.
Com elas
condena-se a arrogância do opressor e sobretudo a sua idolatria.
Foi nas
realidades descritas pelo profeta que as gerações posteriores descobriram
retratada a sua própria experiência.
3. Salmo (Hab
3,1-19): composição litúrgica sobre a intervenção de Deus que cumpre a sua
profecia, atestada pelas indicações musicais que o enquadram.
Apesar de este
salmo não constar no comentário de Habacuc encontrado entre os textos de Qumrân (1QpHab), não se pode
daí concluir que este capítulo não fizesse parte do texto do profeta.
Teologia
A voz de
Habacuc dirige-se a uma população traumatizada por guerras, injustiças e
violência. Por isso assume um tom mais encorajador e reconfortante, sem
insistir muito nas admoestações características do discurso profético.
Partindo do
tema dam opressão estrangeira sobre Judá e, portanto, do âmbito das relações
internacionais, onde as injustiças se infiltram, eleva-se a figura de Deus, que
faz a sua intervenção na história e que se apresenta como o seu Senhor.
Isto é patente
em todo o livro e torna-se seguro e evidente aos olhos do justo, pois este
viverá pela sua fé (Hab 2,4).
É a esta luz
que se pode ler igualmente o salmo que encerra o livro de Habacuc (3,1-19).
Com a
solenidade que lhe vem de um texto de oração, este salmo representa a resposta
definitiva do Senhor às interrogações do povo, que estavam condensadas nos
lamentos do profeta referidos no seu diálogo com Deus (Hab 1,2 – 2,4).
O salmo
apresenta uma intervenção de Deus com os traços de uma epifania e sob a forma
de um hino de louvor.
Esta conclusão
em poema pode ser vista como uma continuidade dos traços com que Deus é
apresentado nos dois capítulos anteriores.
O facto de
aparecer um termo que significa intervalo ou pausa (selah) nos v. 3, 9, 13 é
sinal de que o salmo era utilizado na liturgia.
Israel
reconhece que pecou e que merecia castigo. No entanto, interroga-se sobre o
problema do mal e sobre a aparente impassibilidade de Deus diante do sofrimento
do seu povo.
Tais lamentos
podem de igual modo condensar as interrogações e ansiedades que atormentam
tantos crentes ao longo dos tempos.
Os judeus
associados com a comunidade de Qumrân terão descoberto uma particular sintonia
na maneira como Habacuc apresenta o papel de Deus nos caminhos difíceis da
História.
A formulação
paulina da teologia da justificação, segundo a qual «o justo viverá pela sua fé» (2,4), retoma uma sentença fundamental
deste profeta (Rm 1,17; Gl 3,11; cf. Heb 10,38).
E esta fórmula
apresenta-se até aos dias de hoje como uma chave de interpretação do espírito
essencial do cristianismo.
Nota:
Texto
introdutório à tradução provisória do Livro de Habacuc, destinado à recolha de contributos dos leitores, no
sentido de aperfeiçoar a sua compreensibilidade. Os comentários devem ser
enviados para o endereço eletrónico: biblia.cep@gmail.com
Fonte: SNLiturgia