São Bernardo de Claraval, o Doutor melífluo

São Bernardo de Claraval, o Doutor melífluo

São Bernardo de Claraval

São Bernardo de Claraval (1091-1153) é uma das grandes figuras da Idade Média, em especial no âmbito da História da Igreja medieval (Lortz).

O ramo dos Cistercienses, que segue os seus ensinamentos, também é designado, às vezes, por Ordem dos Bernardinos.

Em 1115 fundou o Mosteiro de Claraval, filial da casa-mãe de Cîteaux.

Bernardo é um dos melhores pregadores do seu tempo; a sua arrebatadora eloquência torna-o merecedor do título de Doctor mellifluus (doutor melífluo).

Em França, na Flandres e zonas do Reno, ele exorta à Segunda Cruzada. Autor de escritos teológicos de grande interesse para a História da Igreja, foi canonizado em 1174.

São Bernardo e o misticismo medieval

A piedade de Bernardo deixou profunda marca em toda a Idade Média, dado que determinou durante séculos o estilo e o conteúdo da oração pessoal.

E Bernardo que aponta as linhas fundamentais do misticismo medieval, principalmente para o culto de Cristo e de Nossa Senhora, enquanto ao mesmo tempo a sua religiosidade tem profundas raízes na filosofia dos padres da Igreja.

Como místico, rejeita toda a espécie de manifestação exterior da Igreja. Polemiza contra o fausto de Cluny, e critica o papa pelas suas aspirações à supremacia política e ao poder temporal, apesar de o apoiar na questão das investiduras, pois defende a autonomia da Igreja Cristã.

A sua suposta rejeição da cultura e da ciência, em favor de um laço direto entre Deus e o Homem, vivido no próprio íntimo, terá profunda influência no mundo medieval e largo futuro.

Influência de São Bernardo na arquitetura

São decisivas as indicações de Bernardo referentes à construção de conventos e à ornamentação das igrejas e dos mosteiros.

Bernardo renuncia praticamente a todo o enfeite, mas exige o máximo cuidado manual na execução dos lavores.

No aspeto arquitetónico exterior, já se pode reconhecer a igreja cisterciense pela regular disposição dos blocos de pedra e pela perfeição da estrutura em tijolos.

Outras características são a falta de torres (permite-se apenas o cavaleiro para dispor o sino), a abside geralmente retilínea, os vitrais incolores ou em grisalha e não polícromos, a ausência de capitéis ornamentados e a escassez ou inexistência de rendilhados decorativos e de estruturas destinadas a esteio das abóbadas, no período gótico.

São Bernardo e a Ordem de Cister

Bernardo de Claraval desempenha um relevante papel na difusão da Ordem Cisterciense, na qual ingressou em 1113 juntamente com alguns parentes e amigos, entre os quais se encontravam quatro irmãos seus.

A Ordem, que pouco antes quase parecia extinguir-se, conta com mais de 343 casas depois da morte de Bernardo, das quais 168 são fundações da casa-mãe de Claraval, enquanto outras 68 se devem ao próprio Bernardo em pessoa.

Durante o período em que foi abade, 888 monges tomaram os votos da Ordem. Em fins do século XII, existem no Ocidente 530 mosteiros de monges cistercienses e numerosos conventos de monges, mas o maior florescimento só ocorrerá no século XIII.

Claraval e Cluny

Claraval e Cluny representam duas concepções fundamentalmente opostas do monaquismo medieval.

A regra cisterciense pretende ser uma crítica prática a Cluny.

O profundo contraste entre Bernardo de Claraval e Pedro Venerável de Cluny (1122-1156) reflecte-se na polémica literária. Bernardo também polemiza com Abelardo, ao mesmo tempo que mantém contacto epistolar com todos os homens ilustres da sua época. (1)

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Amo porque amo, amo para amar

“O amor subsiste por si mesmo, agrada por si mesmo e por causa de si mesmo. Ele próprio é para si mesmo o mérito e o prémio. O amor não busca outro motivo nem outro fruto fora de si; o seu fruto consiste na sua prática. Amo porque amo; amo para amar. Grande coisa é o amor, desde que remonte ao seu princípio, que volte à sua origem, que torne para a sua fonte, que se alimente sempre da nascente donde possa brotar incessantemente. Entre todas as moções, sentimentos e afectos da alma, o amor é o único em que a criatura pode corresponder ao Criador, se não em igual medida, ao menos de modo semelhante. Com efeito, Deus, quando ama, não quer outra coisa senão ser amado: isto é, não ama por outro motivo senão para ser amado, sabendo que o próprio amor torna felizes os que se amam entre si.

O amor do Esposo, ou antes o Amor Esposo, não pede senão correspondência e fidelidade. A amada deve, portanto, retribuir com amor. Como pode a esposa não amar, sobretudo se é a esposa do Amor? Como pode o Amor não ser amado?

Com razão renuncia a qualquer outro afecto e se entrega total e exclusivamente ao Amor a alma consciente de que o modo de corresponder ao amor é retribuir com amor. Na verdade, mesmo quando toda ela se transforma em amor, que é isso em comparação com a torrente perene que brota daquela fonte? Evidentemente, não corre com igual abundância o caudal do amante e do Amor, da alma e do Verbo, da esposa e do Esposo, da criatura e do Criador; há entre eles a mesma diferença que entre a fonte e quem dela bebe.

Sendo assim, ficará sem qualquer valor e eficácia o desejo da noiva, o anseio de quem suspira, a paixão de quem ama, a esperança de quem confia, porque não pode acompanhar a corrida do gigante, igualar a doçura do mel, a mansidão do cordeiro, a beleza do lírio, o esplendor do sol, a caridade d’Aquele que é a caridade? Não. Porque embora a criatura ame menos, porque é menor, se todavia ela ama com todo o seu ser, nada fica por acrescentar. Nada falta onde está tudo. Por isso, este amor total equivale ao desposório, porque é impossível amar assim sem ser amado, e neste mútuo consentimento de amor consiste o autêntico e perfeito matrimónio. Quem pode duvidar de que a alma é amada pelo Verbo, antes dela e mais intensamente? “

Dos Sermões de São Bernardo, abade, sobre o Cântico dos Cânticos

(Sermão 83, 4-6: Opera Omnia, ed, Cisterc. 2 [l958], 300-302) (Séc. XII) (2)

Fontes: (1) História Universal Comparada – V (texto editado e adaptado) (2) SNLiturgia

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