Como é o teu olhar?

São os olhos a janela da alma. O que de menos corpóreo existe no nosso corpo.

Por eles nos debruçamos sobre o mundo. E, através deles, vislumbram os demais um pouquito do nosso mundo interior.

Como é o teu olhar?

Os olhos das crianças são grandes, abertos, puros. Ressumam candura, inocência, brancura.

São olhos de lírio, suposto que os lírios os têm também. Olhos que nada temem, que tudo esperam.

Olhos confiados, inermes, dóceis. Tu tiveste esses olhos.

Como é o teu olhar?

Há olhares torvos, esquivos, falsos. Olhos que temem ser descobertos, se olham de frente. Olhos que temem ser abertos.

Olhos que não sustentam um olhar franco, direto, investigador.

Como é o teu olhar?

E há olhos sujos. Olhos que buscam com avidez, com dissimulação, com maldade o que sabem não dever buscar.

Olhares rápidos, certeiros. Ou sinuosos. Que logo se escondem. Encolhidos traiçoeiros, que logo se acachapam, inflamados de volúpia, à espreita da próxima fêmea.

Como é o teu olhar?

Há olhos que choram. Olhos com estrias marcadas pela dor, pelo abandono, pela morte.

Que precisam de consolação e de ternura. Olhos de mães, olhos de viúvas, olhos, também, de noivas e de esposas.

Como é o teu olhar?

E há olhos sombrios, cheios de nuvens, velados pela névoa dos vícios. Olhos que sofrem porque a alma sofre, ainda que o corpo diga o contrário.

Olhos que veem aproximar-se a bancarrota final. Olhos que têm de ficar prisioneiros de um corpo grosseiro e opaco, quando desejariam subir e voar.

Diz-me: Como é o teu olhar?

Fonte: “Bornal de Peregrino”, Valentim Galindo – 1972 (texto editado) | Imagem

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