“Mater et Magistra” – Carta Encíclica de Sua Santidade João XXIII
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“Mater et Magistra”Carta Encíclica de Sua Santidade João XXIII |
“Mãe e mestra de todas as gentes, a Igreja universal foi instituída por Jesus Cristo para que todos os homens, ao longo dos séculos, no seu seio e amplexo, encontrassem plenitude de vida mais alta e garantia de salvação.
A esta Igreja, coluna
e fundamento de verdade (1), o seu Divino Fundador confiou uma tríplice
missão: gerar filhos, educá-los e governá-los, guiando com maternal cuidado a
vida dos indivíduos e a dos povos, cuja grande dignidade. Ela sempre teve no
máximo respeito e protegeu com solicitude.
O Cristianismo
é de facto a união da terra com o céu, enquanto toma o homem na sua realidade
concreta espírito e matéria, inteligência e vontade vida a elevar a mente das
mutáveis condições da vida terrestre para as alturas da vida eterna, que será
consumação interminável de felicidade e de paz.
Embora, pois, a
Santa Igreja tenha antes de tudo a missão de santificar as almas e torná-las
participantes dos bens de ordem sobrenatural, mantém-se, todavia, solícita a
respeito das exigências da vida quotidiana dos homens, não só quanto à
sustentação e condições de vida, mas também quanto à prosperidade e à
civilização nos seus múltiplos aspectos e segundo as várias épocas.
A Santa Igreja,
realizando tudo isto, executa a orientação de Jesus Cristo, seu Fundador, que,
referindo-se, sobretudo, à salvação eterna do homem quando diz: Eu sou o
caminho, a verdade e a vida (2) e Eu sou a luz do mundo
(5), noutra ocasião, vendo a multidão esfaimada, prorrompeu nestas palavras: Tenho compaixão desta gente (4), deu
assim prova de se preocupar também com as exigências terrenas dos povos.
O Divino
Redentor mostra este cuidado não só por palavras, mas também com os exemplos da Sua vida, quando, para matar a fome da multidão, multiplicou os
pães e os peixes miraculosamente. E com este pão, dado para nutrir o corpo,
quis pré-anunciar aquele alimento celestial das almas que deixaria aos homens
na véspera da sua Paixão.
Não admira,
pois, que a Igreja Católica, à imitação de Cristo e segundo o Seu mandato,
durante dois mil anos, isto é, desde a constituição dos antigos Diáconos até
aos nossos tempos, constantemente tenha mantido alta a chama da caridade, não
menos com os preceitos do que com os exemplos largamente dados. Caridade que, harmonizando
os preceitos do mútuo amor com a sua prática, realiza admiravelmente e
compendia a doutrina e a acção social da Igreja.
Insigne
documento de tal doutrina e acção, realizadas ao longo dos séculos pela Igreja,
é sem dúvida a imortal Encíclica Rerum Novarum (5), promulgada,
há 70 anos, pelo Nosso Predecessor Leão XIII, para enunciar os princípios com
que se pudesse resolver cristãmente a questão operária.
Poucas vezes a palavra do Papa teve como então uma ressonância tão universal, em profundidade de argumentação, amplitude e poder incisivo. As suas orientações e instâncias tiveram tanta importância que de nenhum modo poderão cair no esquecimento.
Um
caminho novo se abriu à acção da Igreja, cujo Pastor Supremo, fazendo seus os
sofrimentos, os gemidos e as aspirações dos humildes e dos oprimidos, mais uma
vez se ergueu em defensor dos seus direitos.
E hoje, passado
já longo período de tempo, é ainda operante a eficácia daquela Mensagem, não só
nos documentos dos Pontífices sucessores de Leão XIII, que nos seus
ensinamentos sociais continuamente se lhe referem, quer para dela tirarem
inspiração, quer para lhe esclarecer o alcance, sempre para proporcionar
incentivo à acção dos católicos, mas até nas próprias organizações dos povos.
Prova isto que
os princípios cuidadosamente aprofundados, as directivas históricas e as
paternais recomendações, contidos na magistral Encíclica do Nosso Predecessor,
conservam ainda o seu valor e até sugerem novos e vitais critérios para que os
homens possam julgar o conteúdo e as proporções da questão social, tal qual
hoje se apresenta, e se decidam a assumir as correspondentes responsabilidades."
(1) Cfr. I Tim. 3, 15.
(2) Jo. 14, 6.
(3) Jo. 8, 12.
(4) Marc. 8, 2.
(5) Acta Leonis XIII, XI, 1891, págs. 97-144.
Texto da 4ª edição, Agosto de 1961 (editado)
Ler a Carta Encíclica na íntegra