“Entre a ponte e o rio está a Misericórdia de Deus”


Ao lermos, em qualquer dos Evangelhos, sobre a crucifixão de Jesus, verificamos que Ele não morreu sozinho no alto do Calvário. 

Outros, malfeitores de delito comum – ladrões, salteadores, assassinos, … -, ou que apenas tinham posto em causa a pax romana, tinham sido também crucificados ao mesmo tempo. 

Quantos foram crucificados com Jesus, não o sabemos. Terão sido dois, pelo menos.

Mateus diz-nos que "Até os salteadores, que estavam com Ele crucificados, o insultavam." (Mt 27, 44). 

Marcos escreve: "Até os que estavam crucificados com Ele o injuriavam." (Mc 15, 32). 

Lucas, sem o referir concretamente, parece apontar para dois malfeitores crucificados com Jesus, quando escreve «Ora, um dos malfeitores que tinham sido crucificados insultava-O… Mas o outro, tomando a palavra, repreendeu-o.»  

João é o único que indica o número: «… onde o crucificaram, e com Ele outros dois, um de cada lado, ficando Jesus no meio.» (Jo 19, 18).

Estes dois que foram crucificados com Jesus, e na sequência da narração dos factos e das palavras feita por Lucas, ficaram para sempre conhecidos, segundo a tradição católica e a piedade popular, como “Dimas” (o "bom ladrão”, crucificado à direita) e “Simas” (o "mau ladrão”, crucificado à esquerda).

Dos quatro evangelistas, apenas S. Lucas descreve a troca de palavras entre os três crucificados: os insultos do “mau ladrão”, a repreensão que lhe dá o “bom ladrão”, a súplica deste a Jesus, e a resposta que Ele lhe dá: «Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso

E parece que entre os três nada mais aconteceu a seguir. Ou terá acontecido?

Depois de responder, de forma tão categórica, ao pedido que lhe tinha sido feito pelo crucificado ao seu lado direito, Jesus voltou o Seu rosto para o lado esquerdo, e os Seus olhos encontraram e tocaram os olhos daquele que ainda há muito pouco O insultava com palavras cruéis e injustas.

E Jesus olhou-o de tal forma, com um carinho inefável, que o coração daquele homem, fechado e feito pedra pelas agruras da vida, começou a abrir brechas e a deixar-se invadir pelo Amor do Divino Mestre.

De tal modo que, com o coração adoçado pelo olhar amoroso de Jesus, aquele malfeitor, “o mau ladrão”, começou a chorar. 

E cada lágrima mais não era do que a expressão sentida do seu arrependimento sincero por cada maldade praticada desde que se lembrava.

Cada vez lhe custava mais respirar, as dores eram imensas, e já não tinha forças para dizer o que quer que fosse. 

E foi apenas com o olhar que suplicou a Jesus para que também se lembrasse dele quando estivesse no "Seu Reino". 

E Jesus, apesar das suas dores indescritíveis, terá sorrido, e, também apenas com o olhar, ter-lhe-á assegurado: «Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso

S. João Maria Vianney, Cura d’Ars, disse a uma viúva, cujo esposo se tinha suicidado, atirando-se duma ponte para o rio: Senhora, entre a ponte e o rio está a misericórdia de Deus”. 

Ou seja, até ao último milionésimo de segundo antes da morte, a salvação é sempre possível! 

E não há pecado que Deus não possa perdoar, desde que ao encontro do seu Amor Misericordioso vá um coração verdadeiramente arrependido!

José Pinto (versão ampliada de texto publicado no jornal “A Voz de Trás-os-Montes”, 26/05/2022) | Imagem

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