«Não ardia cá dentro o nosso coração…?»

 

“Qual é a razão íntima da fecundidade da Palavra de Deus? É o facto de Cristo estar vivo: Ele é o Deus que salva e vivifica. [...]

Ora, com as devidas proporções, o que se pode dizer da Pessoa de Jesus também se pode dizer da sua Palavra; e o que era verdadeiro ontem é ainda mais verdadeiro hoje.

Cristo vive na alma do justo; sob a orientação infalível deste Mestre interior, a alma [...] penetra na claridade divina.

Cristo dá-lhe o seu Espírito, primeiro autor dos livros sagrados, para que ela perscrute as próprias profundezas do infinito (cf 1Cor 2,10), contemple as maravilhas que Deus fez pelos homens, observe, pela fé, as proporções divinas do mistério de Jesus, e se deixe iluminar, tocar, atrair, fascinar, elevar, transportar e transformar por este espetáculo admirável, cujo esplendor a ilumina.

Por seu turno, ela experimenta aquilo que sentiram os discípulos de Emaús quando o próprio Jesus Se dignou explicar-lhes os livros sagrados: «Não ardia cá dentro o nosso coração, quando Ele nos falava pelo caminho e nos explicava as Escrituras?».

Não espanta, pois, que a alma, encantada e conquistada por esta palavra viva «que penetra até às junturas» (Heb 4,12), torne sua a oração dos discípulos: «Senhor, fica connosco, Tu que és Mestre incomparável, luz indefetível, verdade infalível, única vida verdadeira da nossa alma!».

Antecipando estes desejos piedosos, o Espírito Santo «faz ouvir em nós os seus gemidos inefáveis» (Rom 8,26), que constituem a verdadeira oração, o desejo veemente de possuir a Deus, de não mais viver senão para a glória do Pai e de seu Filho Jesus.

O amor, engrandecido e ardente ao contacto com Deus, invade todas as potências da alma, tornando-a forte e generosa, capaz de realizar na perfeição todas as vontades do Pai, entregando-se plenamente ao prazer divino.”

Beato Columba Marmion (1858-1923), abade | «A oração monástica» | Imagem